Com um mercado editorial marcado por grandes editoras que buscam cada vez mais o melhor em publicações nos mais variados gêneros, ainda é difícil para muitos autores iniciantes conseguir o tão desejado direito de ser lido e ter sua obra reconhecida pelo grande público. Aliado a isso, temos a severa realidade de um país que se encontra como o 53º em educação; onde o analfabetismo funcional na faixa etária de 15 e 64 anos alcançou, segundo o IBOPE, 28% no ano de 2009; onde 30% dos alunos que chegam no 5º ano não conseguem ler e 20% dos alunos que “concluem” o ensino fundamental não dominam o uso da leitura e da escrita.
É preciso que se tenha uma visão holística da realidade no que diz respeito à produção em nosso país. Para isso, basta olhar um pouco – nem precisa tanto – ao redor para ver o que existe de produção no Brasil.
É triste, mas se queremos mudar alguma coisa temos que colocar os pés no chão e encarar o fato irrefutável de que se produz muito no Brasil; no entanto, há pouca preocupação com a forma, o estilo e o requinte daquilo que se produz. E por quê? Os dados acima falam por si.
Tudo bem, devemos dar às pessoas o direito à livre produção, ao extravaso de sua ideias e “criatividade”. O problema é: o que se tem de subsídio para a criatividade? A resposta é ainda mais triste: apenas o empirismo de nossos cotidianos particulares. Muitas pessoas estão entregues à produção sem vínculos com boas referências.

É preciso cultivar para colher

Não podemos pensar que os moradores de uma favela, por exemplo, “só podem” tocar e cantar funk pancadão, rap, swingueira; que a periferia “só pode” ouvir e cantar pagode, reagge, forró – sem desmerecer nenhuma dessas expressões, pois são expressões culturais também – porque esse é o retrato de suas comunidades, como li certa vez em uma rede social alguém dizendo que a elite já teve seu espaço e agora devemos deixar a periferia ter o seu, mostrando o que “ela possui”.
Me perdoe, mas isso se chama comodismo!
Quem disse que na periferia não há quem ouve ou se interesse por música clássica, MPB, música ambiental, e tantas outras expressões que sequer estão na grande mídia? Quem disse que nesses setores da sociedade não há quem consuma boa leitura, não só estrangeira, mas nacional? Tudo depende da disposição e da boa vontade de se buscar o novo, o diferente; da atitude de querer cultivar uma boa cultura.
Lembro agora de uma conversa que tive com uma pessoa, quando passei um curto período em Fortaleza, sobre um grupo de crianças com um trabalho musical, uma espécie de orquestra popular, onde elas tocavam tambores entre outros instrumentos. Tudo feito de forma artesanal devido à condição desfavorável dessa meninada da periferia; no entanto, possuíam músicas de qualidade. Detalhe: só para o papa, eles já tinham tocado quatro vezes.
Quem decidiu que o produto da periferia não pode ter uma qualidade extra periférica? Que só se pode retratar a violência? Mas se tiver de retratá-la, que o faça com qualidade, com estilo. E isso se adquire no contato com boas produções (musicais, literárias etc.). E os meios para isso estão ao alcance de todos. O acesso às bibliotecas públicas e espaços literários está cada vez maior.
Não há desculpas! Fica o exemplo acima citado.

As exigências não são apenas editoriais, devem ser acima de tudo pessoais

As exigências das editoras visam o lucro. Elas podem até estar compromissadas com a leitura em nosso país, mas o lucro é a palavra-chave. No entanto, todos que produzem deveriam estar em condições de concorrer com suas obras nesse mercado. Não que o autor deva se render ou até mesmo se vender às exigências editoriais; não é isso. Mas um autor que se autocultiva com boas leituras tem muito a oferecer.
Além disso, existe o fato de que as editoras (as grandes principalmente) tem preferência em publicar quem já é conhecido. E não precisa ser conhecido no meio literário, basta ser uma pessoa com uma imagem já creditada pela grande mídia. A razão é bem simples: editoras não gostam de apostar no escuro; elas querem todas as luzes bem acesas para que possam fazer o melhor lance possível. Não entram para perder.
Até mesmo aqueles autores iniciantes que têm um certo talento verificado e poderiam ter uma chance para serem (re)conhecidos, são podados por essas editoras que, na dúvida se são eles a melhor escolha para a qualidade de seus catálogos, decidem não investir no autor. Apenas os consagrados têm vez.
Temos, por outro lado, um crescimento considerável de pequenas editoras no país que são mais flexíveis e dão preferência a autores iniciantes; mas até essas possuem lá suas exigências, pois, o lucro ainda é o grande foco de toda empresa que se lança no mercado.
Em setembro de 2017 aconteceu a Bienal do livro, no Rio de Janeiro, onde essas editoras menores debateram sobre a questão do atual mercado editorial em nosso país, e como podiam criar estratégias para que o livro chegasse nas mãos de um maior número de leitores. Muitas são unânimes em afirmar que seu foco (além do lucro) é fomentar o hábito da leitura no país com a consequente formação de leitores. E que a batalha é encontrar “bons autores” para que se busque um público para eles.
Uma pessoa de uma dessas editoras (não quero citar nomes, pois não vem ao caso), e que participou do debate, disse ter ficado impressionada com o número de publicações no Brasil, e que tem editora com até 70 publicações por mês.
Temos então o seguinte quadro: há pessoas publicando no Brasil, e em grande escala. Mas quem são esses autores? De fato, muito já se tem produzido nesses últimos anos, tanto no Brasil como no exterior. É grande a safra de novos autores, principalmente na ficção, filão que ainda possui grande predileção.
Devemos considerar ainda uma outra questão: aqueles autores que possuem uma certa condição financeira, tiram do bolso e pagam a uma editora as que trabalham com prestação de serviço para ter sua obra publicada. Também é uma forma de ser publicado, sem maiores exigências.
Mas e aqueles autores que não possuem condições de bancar a própria obra e não conseguem espaço com as editoras convencionais?

A autopublicação no Brasil

Bem, hoje, autores sem oportunidades no mercado editorial podem contar com o gratificante trabalho das editoras alternativas (como estou chamando aqui) que lidam com a autopublicação. Como assim? Se você tem uma obra escrita, em qualquer gênero, e deseja publicá-la sem nenhum custo a pedido da editora, é só enviar que ela publica. Simples assim.
Não há custo para que a editora publique o livro, mas sempre há algum gasto com a obra. Se você não for uma pessoa que gosta de correr riscos com a sua publicação e preza por um texto limpo e isento de erros gramaticais, como autor, você irá preparar o seu original enviando-o para um profissional avaliá-lo e fazer as possíveis correções antes de autopublicar.
Isso sem contar outros serviços como capa, ficha catalográfica, ISBN, se você faz questão de tê-lo, diagramação etc. Isso sempre traz algum gasto. No final, compete à pessoa decidir se vale ou não apena autopublicar uma obra.
Existem hoje no mercado algumas plataformas de autopublicação, como: Clube de autores (pioneira no ramo); Bookeers; Amazon, com a plataforma Kindle Direct Publishing; a Publique-se, da livraria Saraiva; Writing Life, plataforma de autopublicação para Kobo, leitor digital também da Saraiva e principal concorrente do Kindle; e-galáxia.

Vantagens e desvantagens da autopublicação

É óbvio que a principal vantagem da autopublicação é a gratuidade do serviço que a grande maioria das plataformas fornece. No clube de autores, por exemplo, quando o autor envia o seu livro em formato PDF (esse costuma ser o formato solicitado) a obra já cai no site da editora com o preço estabelecido. O mesmo acontece em outras plataformas como a Amazon.
Já as desvantagens, podemos elencá-las:

1º- geralmente as plataformas não dão um suporte de divulgação para as obras. Uma vez autopublicado, cabe ao autor divulgar sua obra por meio das ferramentas que a internet dispõe, como as redes sociais.
Algumas plataformas ainda disponibilizam a obra do autor em outros sites de grande circulação, no entanto, isso não garante muito que a obra seja lida, pois sendo o autor ainda desconhecido, ela será apenas uma entre tantas outras.

2º- qualquer pessoa pode publicar, independente da qualidade da obra. A filosofia de plataformas como Clube de autores, por exemplo, é: se você quer publicar, nós publicamos; o crivo sobre sua obra é dado pelo público. É justo, mas volto a frisar que o maior responsável pela qualidade do que se produz, é o autor. Sendo autopublicação, a editora não dará dicas ou qualquer outro apoio ao autor para a melhoria de sua produção.

3º- há uma grande diferença em uma obra ser recebida por uma editora convencional, lida, avaliada e comprada por essa editora, em vez de apenas lançada pelo próprio autor numa plataforma de autopublicação. Soa severo, mas é fato. Uma obra que foi sondada e aceita por uma editora convencional, possui um mérito diferente: sua qualidade literária foi reconhecida.

De fato, com a autopublicação muito se produz e é lançado, mas, sem o fator “avaliação”, o que teremos de produção brasileira de verdade? Qual a identidade literária nosso país terá, daqui a algum tempo? Teremos mais quantidade ou qualidade?
Não há dúvida de que muita gente boa se encontra nessas plataformas de autopublicação. Pessoas que deveriam ser escolhidas pelas outras editoras, mas não recebem crédito para isso e buscam o meio mais alternativo e que deve sim existir, não digo o contrário para ter suas ideias e criatividade levadas para o grande público.
Imagine se todos que desejam produzir e todos deveriam produzir e fazer valer a máxima de Monteiro Lobato: “um país se faz com homens e livros” antes, consumissem produções sofisticadas e recebessem o legado dos grandes escritores. Como não teríamos obras lançadas de forma independente com a qualidade que mereciam ter. Esse, é o grande desafio da autopublicação.

Referências:

Brasil Escola. Educação no Brasil. Disponível em: <https://brasilescola.uol.com.br/educacao/educacao-no-brasil.htm#slider-1>.

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